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O CAMINHO FEMININO PARA A REFORMA AGRÁRIA
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Esta reflexão é parte de uma dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de História da PUC-SP, em abril de 19982. O estudo apresenta a analisa as experiências vividas por mulheres assentadas em Promissão-SP, procurando desvendar se haveria um caminho feminino para a reforma agrária. Para compreender o significado que atribuem à sua luta enquanto semterras, as mulheres foram focalizadas em três dimensões: na sua trajetória de vida, no trabalho e na vida cotidiana, analisando-se a experiência de estarem construindo uma nova cultura, conseqüência de um projeto que é, ao mesmo tempo, um projeto pessoal, de mulheres que sonham com uma vida melhor; das respectivas famílias, que finalmente conquistaram um espaço para viver e trabalhar; e do MSTMovimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, ao qual se identificam, à medida que se assumem como sem-terras. Algumas interrogações se colocavam como ponto de partida para o estudo: - que significado teria para as mulheres assentadas a experiência de terem participado de uma ocupação de terra, deixando o modo de vida anterior, na cidade ou no campo e se dispondo a morar debaixo de barracos de lona por tempo indeterminado? - haveria uma nova qualidade no cotidiano da mulher rural, especialmente daquelas que não sendo lideranças, limitam suas atividades ao espaço do assentamento? - que benefícios concretos teriam obtido com essa luta, do ponto de vista social, econômico e cultural? - se homens e mulheres são protagonistas dessa luta e crescem juntos na consciência social e política desde que decidiram ir para a ocupação de terra, por que elas não estavam em número equivalente nas instâncias de decisão do MST? Seria esse um critério para avaliar a contribuição feminina ao MST? - enfim, haveria diferenças significativas na trajetória de homens e mulheres na luta dos sem terras e, nesse sentido, haveria um caminho feminino para a reforma agrária? O estudo busca uma resposta a essas interrogações, em primeiro lugar, olhando o MST da perspectiva das mulheres, compreendendo gênero como construção histórica e, em segundo lugar, buscando identificar e analisar os aspectos culturais, sociais e econômicos que influenciam na visão de mundo e na vida cotidiana das mulheres assentadas, condicionando comportamentos e práticas.Trabalhar com a história oral, centrando a investigação nas trajetórias femininas, requer um cuidado especial, segundo Paul Thompson3. Torna-se necessário, para o/a historiador/a oral, "estar atento às diferenças na linguagem narrativa de homens e mulheres. Os homens tendem a considerar a vida vivida como sua e utilizam o "eu ativo" enquanto as mulheres falam de suas vidas em termos de relações, utilizam expressões e fazem referência à vida passada como 'nós, a gente, eu e meus filhos, eu e meu marido', simbolizando relações subjacentes àquela parte de sua vida". É a internalização, segundo o autor, de atitudes que carregam o peso da cultura na qual as mulheres, para assumirem um lugar positivo no mundo, têm que lutar desde criança e numa luta desigual. A participação ativa das mulheres, excluída da escrita da História (assim como a dos operários e dos prisioneiros, de acordo com Michelle Perrot4), somente há pouco tempo tem sido objeto de pesquisas e investigações. Dentre os estudos recentes que tentam dar visibilidade à luta política das mulheres nas diferentes sociedades, destacam-se os que tentam recuperar as formas de resistência e as saídas que encontraram. E.P. Thompson, no texto: "La economia moral de la multitud", estudando os motins no final do século XVII, diz que as iniciadoras dos motins eram, com freqüência, as mulheres: "Sabemos que en 1693 una gran cantidad de mujeres se dirigieron al mercado de Northampton, con ‘cuchillos escondidos en sus corpiños’ para forzar la venta del grano según su propria evaluación".Sobre a disposição de luta das mulheres, escreve, referindo-se a outro motim, de 1807: "Las mujeres están más dispuestas a amotinarse: tienen menos temor a la ley, en parte por ignorancia, y en parte porque abusan del privilegio de su sexo, y por consiguiente en todo tumulto público sobresalen en violencia y ferocidad".5. Recuperar, pois, a presença ativa das mulheres e sua contribuição histórica no passado tem sido uma preocupação da historiografia atual e nesse sentido, destacase o papel desempenhado pelos movimentos feministas. Mas, igualmente importante, é registrar esse protagonismo nas lutas atuais, para que as mulheres das classes populares ganhem visibilidade e a memória de suas lutas seja perservada.
Title: O CAMINHO FEMININO PARA A REFORMA AGRÁRIA
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Esta reflexão é parte de uma dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de História da PUC-SP, em abril de 19982.
O estudo apresenta a analisa as experiências vividas por mulheres assentadas em Promissão-SP, procurando desvendar se haveria um caminho feminino para a reforma agrária.
Para compreender o significado que atribuem à sua luta enquanto semterras, as mulheres foram focalizadas em três dimensões: na sua trajetória de vida, no trabalho e na vida cotidiana, analisando-se a experiência de estarem construindo uma nova cultura, conseqüência de um projeto que é, ao mesmo tempo, um projeto pessoal, de mulheres que sonham com uma vida melhor; das respectivas famílias, que finalmente conquistaram um espaço para viver e trabalhar; e do MSTMovimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, ao qual se identificam, à medida que se assumem como sem-terras.
Algumas interrogações se colocavam como ponto de partida para o estudo: - que significado teria para as mulheres assentadas a experiência de terem participado de uma ocupação de terra, deixando o modo de vida anterior, na cidade ou no campo e se dispondo a morar debaixo de barracos de lona por tempo indeterminado? - haveria uma nova qualidade no cotidiano da mulher rural, especialmente daquelas que não sendo lideranças, limitam suas atividades ao espaço do assentamento? - que benefícios concretos teriam obtido com essa luta, do ponto de vista social, econômico e cultural? - se homens e mulheres são protagonistas dessa luta e crescem juntos na consciência social e política desde que decidiram ir para a ocupação de terra, por que elas não estavam em número equivalente nas instâncias de decisão do MST? Seria esse um critério para avaliar a contribuição feminina ao MST? - enfim, haveria diferenças significativas na trajetória de homens e mulheres na luta dos sem terras e, nesse sentido, haveria um caminho feminino para a reforma agrária? O estudo busca uma resposta a essas interrogações, em primeiro lugar, olhando o MST da perspectiva das mulheres, compreendendo gênero como construção histórica e, em segundo lugar, buscando identificar e analisar os aspectos culturais, sociais e econômicos que influenciam na visão de mundo e na vida cotidiana das mulheres assentadas, condicionando comportamentos e práticas.
Trabalhar com a história oral, centrando a investigação nas trajetórias femininas, requer um cuidado especial, segundo Paul Thompson3.
Torna-se necessário, para o/a historiador/a oral, "estar atento às diferenças na linguagem narrativa de homens e mulheres.
Os homens tendem a considerar a vida vivida como sua e utilizam o "eu ativo" enquanto as mulheres falam de suas vidas em termos de relações, utilizam expressões e fazem referência à vida passada como 'nós, a gente, eu e meus filhos, eu e meu marido', simbolizando relações subjacentes àquela parte de sua vida".
É a internalização, segundo o autor, de atitudes que carregam o peso da cultura na qual as mulheres, para assumirem um lugar positivo no mundo, têm que lutar desde criança e numa luta desigual.
A participação ativa das mulheres, excluída da escrita da História (assim como a dos operários e dos prisioneiros, de acordo com Michelle Perrot4), somente há pouco tempo tem sido objeto de pesquisas e investigações.
Dentre os estudos recentes que tentam dar visibilidade à luta política das mulheres nas diferentes sociedades, destacam-se os que tentam recuperar as formas de resistência e as saídas que encontraram.
E.
P.
Thompson, no texto: "La economia moral de la multitud", estudando os motins no final do século XVII, diz que as iniciadoras dos motins eram, com freqüência, as mulheres: "Sabemos que en 1693 una gran cantidad de mujeres se dirigieron al mercado de Northampton, con ‘cuchillos escondidos en sus corpiños’ para forzar la venta del grano según su propria evaluación".
Sobre a disposição de luta das mulheres, escreve, referindo-se a outro motim, de 1807: "Las mujeres están más dispuestas a amotinarse: tienen menos temor a la ley, en parte por ignorancia, y en parte porque abusan del privilegio de su sexo, y por consiguiente en todo tumulto público sobresalen en violencia y ferocidad".
5.
Recuperar, pois, a presença ativa das mulheres e sua contribuição histórica no passado tem sido uma preocupação da historiografia atual e nesse sentido, destacase o papel desempenhado pelos movimentos feministas.
Mas, igualmente importante, é registrar esse protagonismo nas lutas atuais, para que as mulheres das classes populares ganhem visibilidade e a memória de suas lutas seja perservada.
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